Regime fiscal de incentivo à capitalização das empresas

Introdução

A Lei n.º 24-D/2022, de 30 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2023, criou um benefício fiscal denominado por Regime fiscal de incentivo à capitalização das empresas.

Este novo benefício vem colmatar a revogação da DLRR e da Remuneração Convencional do Capital Social, cujos efeitos se reportam a 1 de janeiro de 2023.

Posteriormente, a Lei n.º 20/2023, de 17 de maio, veio introduzir algumas alterações e clarificações sobre o funcionamento do benefício.

Importa, por isso, fazer um ponto de situação.

Caracterização do incentivo

O benefício consiste numa dedução ao lucro tributável do IRC, das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, cooperativas, empresas públicas, e demais pessoas coletivas de direito público ou privado com sede ou direção efetiva em território português, de uma importância correspondente à aplicação da taxa de 4,5 % ao montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis.

Esta taxa é majorada em 0,5 pontos percentuais caso o sujeito passivo se qualifique como micro, pequena ou média empresa ou empresa de pequena-média capitalização (Small Mid Cap), de acordo com os critérios previstos no anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro.

A dedução referida não pode exceder, em cada período de tributação, o maior dos seguintes limites:

  • € 2.000.000; ou
  • 30 % do resultado antes de depreciações, amortizações, gastos de financiamento líquidos e impostos, nos termos do artigo 67.º do Código do IRC.

A parte da dedução que exceda o segundo limite acima referido é dedutível na determinação do lucro tributável de um ou mais dos cinco períodos de tributação posteriores, após a dedução relativa a esse mesmo período, com mesmos limites.

Condições de acesso

O incentivo aplica-se exclusivamente aos sujeitos passivos que, no exercício em causa, exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e que preencham, cumulativamente, as seguintes condições:

  • Não sejam entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal ou da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, nem sucursais em Portugal de instituições de crédito, de outras instituições financeiras ou de empresas de seguros;
  • Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;
  • O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos; e
  • Tenham a situação fiscal e contributiva regularizada.

Forma de cálculo

Para cálculo da dedução, o montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis deve ser apurado por referência ao somatório dos valores apurados no próprio exercício e em cada um dos nove períodos de tributação anteriores, considerando-se que o montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis corresponde a zero nas situações em que desse somatório resulte uma diferença negativa.

Todavia, note-se que apenas se consideram os aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis verificados nos períodos de tributação que se iniciem em ou após 1 de janeiro de 2023, ou seja, no período de 2023 apenas serão considerados os aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis ocorridos em 2022.

Sobre este assunto há que ter em conta o regime transitório constante do artigo 12.º da Lei n.º 20/2023, de 17 de maio, o qual estabelece que para efeitos da subalínea IV) da alínea a) do n.º

6 do artigo 43.º-D do Estatuto dos Benefícios Fiscais, considera-se como primeiro lucro contabilístico abrangido o lucro do período de 2022, cuja deliberação e correspondente aplicação, em resultados transitados ou, diretamente, em reservas ou no aumento do capital, ocorra no período de tributação que se inicie em ou após 1 de janeiro de 2023.

Neste cálculo não são considerados os aumentos de capital efetuados com recurso aos lucros gerados no período de tributação com início em 2022 que tenham beneficiado do regime da remuneração convencional do capital social previsto no anterior artigo 41.º-A do mesmo Estatuto.

Outro aspeto importante a considerar no cálculo, são os conceitos que passamos a evidenciar.

Consideram-se aumentos de capitais próprios elegíveis:

  • As entradas realizadas em dinheiro no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do capital social da sociedade beneficiária;
  • As entradas em espécie realizadas no âmbito de aumento do capital social que correspondam à conversão de créditos em capital;
  • Os prémios de emissão de participações sociais;
  • A aplicação dos lucros contabilísticos passíveis de distribuição, de acordo com a legislação comercial, em resultados transitados ou, diretamente, em reservas ou no aumento do capital.

Consideram-se aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis, a diferença, positiva ou negativa, entre:

  • Os aumentos dos capitais próprios elegíveis; e,
  • As saídas, em dinheiro ou em espécie, a favor dos titulares do capital, a título de redução do mesmo ou de partilha do património, e as distribuições de reservas ou resultados transitados.

Ao contrário, para efeitos do presente regime não são considerados os aumentos de capitais próprios elegíveis que resultem de:

  • Entradas realizadas em dinheiro, no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do capital da sociedade beneficiária, que sejam financiadas por aumentos de capitais próprios elegíveis na esfera de outra entidade;
  • Entradas realizadas em dinheiro, no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do capital da sociedade beneficiária por entidade com a qual o sujeito passivo esteja em situação de relações especiais que sejam financiadas através de mútuos concedidos pelo próprio sujeito passivo ou por outra entidade com a qual essa entidade e o sujeito passivo estejam em situação de relações especiais
  • Entradas realizadas em dinheiro, no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do capital da sociedade beneficiária, por uma entidade que não seja residente para efeitos fiscais noutro Estado-Membro da União Europeia ou no Espaço Económico Europeu ou noutro Estado ou jurisdição com o qual esteja em vigor convenção para evitar a dupla tributação internacional, acordo bilateral ou multilateral que preveja a troca de informações para fins fiscais.

Exemplo prático de aplicação

Um dado sujeito passivo que se caracteriza como PME, enquadrado no regime geral do IRC, apresentou no período de 2022, um resultado líquido contabilístico de € 34.500,00.

A Assembleia Geral de aprovação de contas, ocorrida em 31 de março de 2023, deliberou a seguinte distribuição deste resultado:

  • € 10.000,00 para incorporação imediata em capital, com vista ao aproveitamento do benefício fiscal da Remuneração Convencional do Capital Social;
  •  12.500,00 para distribuição aos sócios, a pagar em setembro de 2023;
  •  12.000,00 permanecerão na conta de Resultados Transitados.

Cálculo do aumento líquido dos capitais próprios elegíveis

  •  34.500  12.500  10.000 = 12.000
  • Benefício a considerar no período de tributação de 2023 = 12.000 x 5% = 600 euros

Valor a deduzir no campo 774 do Quadro 07 da declaração modelo 22 de IRC.

Dr. Abílio Sousa

Consultor fiscal